Um veículo elétrico é o resultado de um grande avanço da engenharia automotiva com muitas vantagens sobre um veículo convencional movido por um motor à combustão interna. Um veículo elétrico, alimentado totalmente por bateria, ou VEB na sigla em Português, permite a mobilidade sem emissão direta de Gases do Efeito Estufa (GEE) – como o CO2 –, produz menos ruído, é muito mais eficiente sob a ótica energética e gasta menos por quilômetro rodado. Então, porque eles ainda não tomaram as ruas?

Quão limpa é a Eletricidade?

Os benefícios de um VEB são questionáveis com relação à origem da eletricidade que recarrega a sua bateria. Ainda hoje, muitos países são muito dependentes de combustíveis fósseis para geração de eletricidade e um VEB não seria necessariamente uma “saída” limpa e sustentável porque a descarbonização deve ocorrer não apenas na ponta de consumo da energia, mas também o mais próximo possível da fonte de geração, reduzindo a pegada de carbono em toda a cadeia. Um grande desafio, portanto, é descarbonizar a matriz de geração antes da massificação dos veículos elétricos. Assim, as emissões de GEE não seriam emitidos pelos VEBs, nem pelas usinas de geração.

Como comparação, um motor à combustão muito eficiente pode emitir pouco menos de 100 g CO2/km. Para se igualar a este motor à combustão, em termos de emissão de CO2, um VEB leve, de eficiência moderada, deve ser recarregado com eletricidade gerada abaixo dos 400 g CO2/kWh. É interessante notar que os motores à combustão resistirão bravamente e a eficiência deles aumentará nos próximos anos. Estima-se que em 2030 os melhores motores à combustão emitirão pouco menos de 60 g CO2/km, colocando ainda mais pressão para que eletricidade seja gerada abaixo de 200 g CO2/kWh. (IRENA. Electric Vehicles: Technology Brief, 2017, p. 35).

Aqui no Brasil, felizmente, cerca de 73% da nossa capacidade de geração centralizada é obtida de fontes mais limpas como a hídrica, solar e eólica. (ANEEL. BIG – Banco de Informações de Geração: Capacidade de Geração do Brasil). Então, recarregar o seu VEB não seria um grande problema por aqui.

Um estudo da Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA, na sigla em Inglês) projeta que em 2030 um veículo de passageiro 100% elétrico no Brasil poderá emitir menos de 20 g CO2/km, por passageiro, devido à grande participação de fontes renováveis e limpas na matriz. (IRENA. Electric Vehicles: Technology Brief, 2017, p. 36). Isso representa um nível de emissão cinco vezes menor que os motores à combustão atuais mais eficientes e econômicos. O País estaria, então, na vanguarda da sustentabilidade para eletrificar a mobilidade, uma solução definitivamente mais limpa e sustentável para o setor de transportes.

Quanto custa?

Ainda há muitos obstáculos que oferecem mais desafios à massificação dos veículos elétricos. O principal deles é o preço – os VEBs são caros! A bateria, parte essencial deste tipo de veículo, pode adicionar atualmente cerca de dez mil dólares ao preço. (IRENA. Electric Vehicles: Technology Brief, 2017, p. 18). Um aspecto decorrente disso é o incentivo financeiro (ou a falta dele) para a compra – sem abatimento no preço as vendas continuarão inexpressivas. Um atalho para as vendas é o carro híbrido, movido conjuntamente por um motor elétrico e outro à combustão. Embora mais acessível e menos poluente que um carro convencional, a bateria de um híbrido oferece baixa autonomia.

Reduzir ou isentar tributos pode impulsionar as vendas, mas hoje a alíquota para eles é de 25%, muito embora se tenha em vista a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos híbridos e elétricos. A nova alíquota do IPI, a partir de 1º de novembro de 2018, deve variar de 7% a 18%, conforme o peso e a eficiência energética dos veículos, e a redução é parte do Programa Rota 2030 criado pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços. Embora o IPI para os elétricos possa até ser equivalente aos modelos à combustão, isso não significa verdadeiramente um incentivo para impulsionar os elétricos em solo nacional.

Enquanto não há incentivos reais para os elétricos, talvez exista vantagens no uso deles. Quanto à despesa para se rodar com um elétrico, a diferença para um carro convencional é significativa. Um carro à combustão econômico pode rodar até 12 km/L de gasolina em trecho urbano, ou seja, o custo com combustível é de R$ 0,35/km. Os elétricos leves podem consumir cerca de 0,21 kWh/km nas mesmas condições, resultando em custo de eletricidade de R$ 0,15/km, considerando-se o atual preço médio do litro da gasolina e da tarifa média de energia no País. A diferença parece ser pouco relevante, mas pode acumular até R$ 2,4 mil em um ano para quem roda mil quilômetros por mês.

Mesmo com despesa operacional menor, um VEB tem Custo Total de Propriedade1 superior. O Custo Total de Propriedade de um VEB e de um carro à combustão tendem a se igualar apenas em 2030, quando se estima que as baterias custem bem menos do que hoje, caindo de US$ 350/kWh para até US$ 150/kWh. (IRENA. Electric Vehicles: Technology Brief, 2017, p. 10).

1 Custo Total de Propriedade é a soma de todos os custos e despesas para adquirir, usar e manter um bem em um período conhecido.

Infraestrutura e Regulamentação Brasileira

O Brasil precisa investir muito se quiser impulsionar a mobilidade elétrica e seguir uma tendência mundial. A cadeia produtiva nacional precisará se adaptar para fabricar peças e instalar linhas de montagem para os veículos elétricos, o que certamente depende de investimento e tempo.

É preciso investir também na infraestrutura de recarga dos veículos elétricos, praticamente inexistente nos dias de hoje. E sobre isso demos um importante passo porque a ANEEL, Agência Nacional de Energia Elétrica, publicou a Resolução Normativa Nº 819, de 19 de junho de 2018, que estabelece os procedimentos e as condições para a realização de atividades de recarga de veículos elétricos. Pela Resolução, a instalação de estações de recargas por unidades consumidoras permite recarga própria e de veículos elétricos de terceiros, inclusive para fins comerciais com livre negociação de preços. (ANEEL. Resolução Normativa Nº 819/2018).

Estimativas para o Futuro dos Elétricos

No mundo, existe potencial para aumentar o número de veículos elétricos leves de pouco mais de 2 milhões em 2016 para 200 milhões em 2030 (IRENA. Electric Vehicles). Por aqui os números e estimativas sobre a frota dos veículos elétricos é imprecisa, mas a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) construiu cenários para 2050 a respeito da eletrificação da frota de veículos leves para transporte doméstico de passageiros. A EPE projeta que os veículos híbridos e VEBs podem representar 15% e 5% da frota, respectivamente. Em um cenário mais otimista os números seriam 23% e 18%, respectivamente, também em 2050 (EPE. Calculadora 2050).

Considerações

Ter um veículo elétrico é uma ideia que atrai muitos consumidores, mas atualmente poucos podem comprar um. O preço é o principal fator que impede a massificação dos elétricos e a queda do preço das baterias combinada com incentivos financeiros pode destravar definitivamente a eletrificação da nossa mobilidade. Enquanto isso, os veículos elétricos lentamente surgem nas ruas, mas em poucos anos representarão uma parcela importante da frota veicular e serão protagonistas de um nítido contraste na mobilidade urbana brasileira.

Fontes:

[1] IRENA. Electric Vehicles: Technology Brief, fevereiro de 2017. Disponível em http://irena.org/-/media/Files/IRENA/Agency/Publication/2017/IRENA_Electric_Vehicles_2017.pdf

[2] ANEEL. BIG – Banco de Informações de Geração: Capacidade de Geração do Brasil. Acesso em 24 de julho de 2018. Disponível em http://www2.aneel.gov.br/aplicacoes/capacidadebrasil/capacidadebrasil.cfm

[3] ANEEL. Resolução Normativa Nº 819/2018. Disponível em http://www2.aneel.gov.br/cedoc/ren2018819.pdf

[4] IRENA. Electric Vehicles. Disponível em http://irena.org/transport/Electric-Vehicles

[5] Empresa de Pesquisa Energética. Calculadora 2050. Acesso em 09 de agosto de 2018. Disponível em http://calculadora2050.epe.gov.br/assets/onepage/21.pdf

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Sobre o autor | Igor Cordeiro é instrutor de energias renováveis na Inergial Energia Ltda.